#002


Hoje fui dar uma volta no shopping. Queria sair um pouco de casa, ver o mundo e tomar um sorvete. Para minha completa estranheza, em frente à franquia onde comprei o milkshake havia dois homens, adultos e barbudos, disputando uma partida de Yu-gi-oh!, um jogo de cartas infanto-juvenil que ficou bastante popular no Brasil junto com a popularização da cultura japonesa nos anos 2000.

De início, achei engraçado. Mas, logo depois, fiquei incomodado com a minha reação natural à inofensiva ação de jogar dos dois. Sempre me imagino como alguém que quer quebrar tabus e que quer ser mais justo com os direitos e expressões culturais das pessoas, mas a primeira reação que tive ao ver aquilo foi contra essa ideia. Senti um pouco de vergonha de como me senti e fiquei pensando sobre o assunto, conectando com o que estava sentindo há uns dias, desde o Carnaval.

Enquanto via os blocos lotados passarem pelas ruas, vi as pessoas se fantasiando a torto e a direito – e muitas vezes com capricho. O que eles fizeram foi simples: gastar dinheiro para construir a fantasia de um personagem e sair para se divertir.

E aí me lembrei das inúmeras vezes que ouvi sobre o fulano que é muito criança porque ainda se fantasia de desenho animado para ir ao evento japonês ali; ou sobre o cicrano que se veste com uma capa de Harry Potter e vai para o parque com os amigos; ou sobre a mulher feita que muitas pessoas dizem já não ter idade pra se vestir como no século passado e tomar chá com as amigas. Quantas vezes já não ouvimos (ou falamos) que certa pessoa já não tem mais idade pra se fantasiar (também chamado de fazer cosplay) e sair na rua assim?

E então por que nós aceitamos uma enxurrada de pessoas fazendo o mesmo no período do Carnaval? Bom, a única coisa que consigo pensar é que o carnaval envolve sexo e álcool, e isso torna o ato de se fantasiar aceitável pela sociedade. Não que tenha alguma coisa errada com fazer sexo ou com encher a cara, mas por que isso valida um comportamento como adulto e deixa o mesmo comportamento, dissociado ao sexo/álcool, como infantilizado? Por que não podemos aceitar um modo de se expressar ou passar o tempo diferente?

Não sei responder por que a sociedade se estruturou dessa forma ou o motivo de ainda estarmos tão presos nisso, mas sei que a única forma de caminharmos para uma sociedade mais empática e justa é que aprendamos a lidar com as diferenças sem subjugar culturas diferentes. Esse é um trabalho complicado, que envolve se observar, pensar sobre suas ações e, todos os dias, buscar se (re)inventar. E da próxima vez que eu vir uma cena inusitada como aquela, espero que eu tenha uma reação diferente. Talvez até passe por perto para ver como anda o jogo.

Posted in . Bookmark the permalink. RSS feed for this post.

Leave a Reply

Tecnologia do Blogger.

Search

Swedish Greys - a WordPress theme from Nordic Themepark. Converted by LiteThemes.com.