Existem duas situações nas quais eu
penso no que escreverei a seguir. Em ambas nunca tive a cara dura de dizer em
voz alta ou escrever, quebrando assim os rituais estabelecidos. A primeira destas
ocasiões é quando tenho que escrever algum projeto de pesquisa sobre um tema
que acho super interessante, tipo as alterações do investimento energético de
somático pra reprodutivo ao longo de um ciclo de vida, e caio naquele maldito
tópico “Justificativa”. A segunda é quando estou apresentando uma pesquisa e o
avaliador/professor vem com a maldita pergunta:
- E por que tu fizeste isso?
Nessas horas tenho a vontade única
de abrir um largo sorriso e falar:
- Porque eu acho isso muito foda!
Sério, cara, quem não acharia legal saber que uma população começa a investir
mais nas gônadas a partir duma idade e para de investir em crescimento? Ou que
tá tudo organizadinho morfologicamente na natureza por causa de séculos de
adaptação? Sério, se você não acha que saber dessas coisas e ficar vendo
exemplos na natureza não é muito legal, você é bem louco.
A realidade é que um cientista de
verdade faz um trabalho porque ama fazer aquilo. Se não gosta da palavra amar,
pode falar que tem um impulso (seja lá de onde ele surja) e que por isso
precisa saber, pesquisar, conhecer, ler, discutir, criar. O que quero falar é
simples, e nem precisava de mais de um parágrafo pra isso: um cientista de
verdade não tem que fazer suas pesquisas por causa da utilidade pública do
conhecimento que tanto lhe desperta interesse e indagações; e sim pelo fato singular
de que ele quer conhecer mais, ampliar a gama de conhecimento do mundo e
entender os processos naturais (hoje em dia sociais, também, pois a ciência não
é mais restrita ao que é natural) que lhe cercam.
Pesquisamos e lemos porque ainda conservamos a curiosidade desde crianças, seja por zoologia, cardiologia, literatura inglesa, sociologia, matemática aplicada. Em suma, é isso que nos (me) move: curiosidade.
E nem adianta me dizer que é necessário contar essas histórias nas nossas justificativas para que possamos receber fundos e continuarmos a pesquisa. Eu sei disso. Você sabe. Todos sabemos, e por isso fazemos. Mas acho que é fundamental conservarmos o foco do porquê estudamos, senão vamos apenas seguir uma série de metodologias instauradas e cristalizadas, perdendo toda a criatividade e curiosidade, gerando relatórios e artigos com pressa e simplesmente por ter que fazê-los. O pior de tudo: perdendo todo o prazer que as pequenas e grandes descobertas um dia nos proporcionou, levando-nos a começar este caminho.
Pesquisamos e lemos porque ainda conservamos a curiosidade desde crianças, seja por zoologia, cardiologia, literatura inglesa, sociologia, matemática aplicada. Em suma, é isso que nos (me) move: curiosidade.
E nem adianta me dizer que é necessário contar essas histórias nas nossas justificativas para que possamos receber fundos e continuarmos a pesquisa. Eu sei disso. Você sabe. Todos sabemos, e por isso fazemos. Mas acho que é fundamental conservarmos o foco do porquê estudamos, senão vamos apenas seguir uma série de metodologias instauradas e cristalizadas, perdendo toda a criatividade e curiosidade, gerando relatórios e artigos com pressa e simplesmente por ter que fazê-los. O pior de tudo: perdendo todo o prazer que as pequenas e grandes descobertas um dia nos proporcionou, levando-nos a começar este caminho.
Excelente texto. Concordo principalmente com o último parágrafo, porém preciso levantar algumas questões que soarão como alfinetadas.
ResponderExcluirNa minha humilde opinião, fazer ciência por fazer é humanamente amador. A ciência não nasceu pra satisfazer o ego da curiosidade humana apenas, mas sim devolver as respostas das nossas perguntas mais importantes para outrem. Hoje em dia no mundo se faz pesquisa de tudo quanto é tipo. A maioria é fútil e dispensável. Integrar banco de dados em sites de revistas científicas é importante, mas apenas pros próprios cientistas. E no final a maioria não chega a nenhuma conclusão per si. Nem mesmo as grandes sociedades internacionais em uma dada área utilizam a expressão "Com certeza" mesmo dispondo uma base de 5000 artigos numa revisão para identificação de um axioma. Nós como cientistas de ciências não exatas, vemos na investigação, no máximo, o despontamento de postulados, deduções. Sempre temos que contar com as malditas exceções.
Então, fazer pesquisa por fazer, por querer saber mais, enquanto nos é investido um dinheiro público, é no mínimo egoísta. Acho lindo o discurso dos primeiros cientistas, usados como exemplos para designar a "pesquisa pela pesquisa". Entretanto, na verdade, (quase) todos eles eram financiados pela burguesia ociosa ou por dinheiro autóctone. Não existia a necessidade de desenvolvimento. Queiramos ou não, atualmente estamos num mundo capitalista, em que os avanços econômicos ou associados são úteis.
Contrariando tudo que eu disse anteriormente, venho com uma indagação: Como saberemos como avançar se não separarmos o joio do trigo? A pesquisa científica não deveria ter o título de "pura" visto que o direcionamento dela é levantar questões, dados, que serão triados e classificados. É muito bom o cientista partir do princípio pessoal da curiosidade, porém não deve se esquecer que o principal intuito de se querer responder tudo é chegar à respostas que servirão de chave de engrenagem, após inúmeros processos seletivos. Em tudo existe uma finalidade, sim, porém o cientista não é capaz de enxergá-la no momento da sua pesquisa "pura" porque ainda não selecionou o que é importante e pra que aquilo será útil.
Não esqueçamos que toda curiosidade humana (toda?) advém de um afã da descoberta de uma funcionalidade e é por isso que a maior pergunta sem resposta é: Qual o sentido da vida?