Trasgo #2


Título: Trasgo – Ficção Científica e Fantasia
Edição: #2
Editor: Rodrigo van Kampen
Autores: Ana Lúcia Merege, Jim Anotsu, Albarus Andreos, Victor de Oliveira de Faria,    George Amaral, Cristina Lasaitis
Ano: 2014

            Surgiu no cenário literário nacional, alguns meses atrás, a revista Trasgo. Sua proposta era reunir o que está sendo feito de literatura fantástica por autores nacionais com boa qualidade. A intenção era ótima, pois temos sentido falta de bons meios de publicação para autores que se empenham na sua produção. Mas não só a intenção foi boa como sua construção também o foi. Na primeira edição, a revista chamou bastante atenção com contos de ótima qualidade e que foram bem aceitos pelo público-alvo, tendo aparecido em diversos blogs e a revista ganhou vários seguidores em redes virtuais.
Assim, a segunda edição manteve a qualidade literária e apresentou uma diversidade ainda maior que a primeira dentro da ficção científica e da fantasia.
            Ana Lúcia Merege, autora do pequeno conto de abertura Rosas, cria dois personagens espetaculares que já são motivo o suficiente para ler a edição até o fim. A protagonista, Mildred, é uma mulher casada que segue uma rotina de cuidar de casa enquanto espera seu metódico marido sem-nome (sempre chamado de professor). Aos poucos, a loucura internalizada da personagem principal se deixa ver por entre sua simples vida cotidiana, chegando a uma situação aterradora – e fantástica. Além disso, a autora mostra alguns conceitos interessantíssimos na entrevista que deu para a revista, e que também merecem atenção por qualquer autor que esteja desenvolvendo sua habilidade de escrita.
            Em seguida tem o conto Cinco Bilhões, de Victor Oliveira de Faria, que constrói um cenário distópico para a humanidade. Num futuro distante, os humanos já não existem como os conhecemos hoje. Modificados geneticamente para as mudanças no sol, eles vivem mutualisticamente com máquinas com alta capacidade de raciocínio. Além disso, a inexistência de sentimentos é um cenário comum, e o surgimento de um exemplar com sentimentos é um fenômeno importante que guia todo o enredo construído pelo autor – e, segundo a entrevista, muito da sua obra.
            Com um toque de humor esplêndido, que me lembrou em alguns pontos do humor de Douglas Adams na série O Guia do Mochileiro das Galáxias, segue o conto de Jim Anotsu, Hamlet: Weird Pop. O conto apresenta um estilo muito próprio do autor. Além disso, mostra várias referências pop ao longo do enredo e traz à mesa uma discussão interessante sobre a adaptação de clássicos, como a que temos visto nos últimos dias pela internet. Nele, uma jovem tenta fazer uma adaptação moderna de Hamlet para os palcos, mas um duende da advocacia, para a surpresa da jovem, surge para defender os direitos autorais da peça, levando a uma conversa fantástica.
            Código Fonte, de George Amaral, já é um conto com um enredo um pouco mais complexo e confuso. Baseado na ideia de transferência de mentes, o autor constrói uma trama desumana na qual um cientista enlouquece diante a deterioração que a velhice traz e promove testes absurdos com seu próprio filho. Embora não tenha bem a ver com o universo criado pelo autor, o sentimento de revolta que a cena final evoca é similar à de um dos primeiros episódios da animação japonesa Full Metal Alchemist, onde um alquimista do governo usa a própria filha numa alquimia de fusão biológica.
            A Maldição das Borboletas Negras, de Albarus Andreos, é um dos contos mais interessantes da revista para mim (assim como Rosas), especialmente pela minha afinidade com a literatura de terror. Numa linguagem mais do que brasileira, o autor percorre a trilha agourenta de um monstro nacional cheio de ambições e sentimentos que acreditamos ser puramente humanos. O mais engraçado do conto é a construção dos nomes e as reações do protagonista ao chegar a certos lugares, tendo um conjunto próprio de morais. Além disso, os nomes dos personagens (entre eles, Jubelina) trazem um charme especial; ao contrário dos nomes sistematicamente estrangeiros que são frequentemente incorporados na literatura nacional por causa da atração quase irracional por aquilo que é de fora.
            Fechando a edição, O Homem Atômico (escrito por Cristina Lasaitis) traz um personagem brasileiro quase cativamente personificado num mendigo com uma boa história pra contar pelos barzinhos da cidade de São Paulo. Tendo participado como cientista de um projeto nuclear anos antes, foi exilado e perdeu tudo o que tinha para que nunca descobrissem nada daquele projeto insano. E por aí deu para falar com tanta convicção o que muitos achavam que era pura loucura, até que a cena final traz uma chuva cinza sobre a capital paulistana.
            A galeria exposta nessa edição já não é do ilustrador Filipe Plagliuso, e sim de Alex Leão. As imagens tem um teor altamente futurista, como a capa da edição, diferindo da capa mais próxima da literatura fantástica que a primeira edição trouxe. Tenho esperanças que alguma das próximas galerias tenha uma cara mais de terror/horror/gore. Assim, a revista organizada pelo Rodrigo van Kampen parece ser bem adequada para os fãs da literatura nacional.
            E já estou à espera da próxima edição!


Obs.: A revista pode ser lida pelo site Trasgo ou ser baixada em formato e-book pelo mesmo endereço.

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One Response to Trasgo #2

  1. Muito obrigado pelos comentários, Bruno. Jubelina é brasileira, e do interior (das profundezas) do Brasilzão. Abraços.

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