Hoje fui dar uma volta no shopping.
Queria sair um pouco de casa, ver o mundo e tomar um sorvete. Para minha
completa estranheza, em frente à franquia onde comprei o milkshake havia dois homens, adultos e barbudos, disputando uma
partida de Yu-gi-oh!, um jogo de cartas infanto-juvenil que ficou bastante
popular no Brasil junto com a popularização da cultura japonesa nos anos 2000.
De início, achei engraçado. Mas,
logo depois, fiquei incomodado com a minha reação natural à inofensiva ação de
jogar dos dois. Sempre me imagino como alguém que quer quebrar tabus e que quer
ser mais justo com os direitos e expressões culturais das pessoas, mas a
primeira reação que tive ao ver aquilo foi contra essa ideia. Senti um pouco de
vergonha de como me senti e fiquei pensando sobre o assunto, conectando com o
que estava sentindo há uns dias, desde o Carnaval.
Enquanto via os blocos lotados
passarem pelas ruas, vi as pessoas se fantasiando a torto e a direito – e
muitas vezes com capricho. O que eles fizeram foi simples: gastar dinheiro para
construir a fantasia de um personagem e sair para se divertir.
E
aí me lembrei das inúmeras vezes que ouvi sobre o fulano que é muito criança porque ainda se fantasia
de desenho animado para ir ao evento
japonês ali; ou sobre o cicrano que se veste com uma capa de Harry Potter e vai
para o parque com os amigos; ou sobre a mulher
feita que muitas pessoas dizem já não ter idade pra se vestir como no
século passado e tomar chá com as amigas. Quantas vezes já não ouvimos (ou
falamos) que certa pessoa já não tem mais idade pra se fantasiar (também
chamado de fazer cosplay) e sair na
rua assim?
E então por que nós aceitamos uma enxurrada de
pessoas fazendo o mesmo no período do Carnaval? Bom, a única coisa que consigo
pensar é que o carnaval envolve sexo e álcool, e isso torna o ato de se
fantasiar aceitável pela sociedade. Não que tenha alguma coisa errada com fazer
sexo ou com encher a cara, mas por que isso valida um comportamento como adulto
e deixa o mesmo comportamento, dissociado ao sexo/álcool, como infantilizado?
Por que não podemos aceitar um modo de se expressar ou passar o tempo diferente?
Não sei responder por que a sociedade se
estruturou dessa forma ou o motivo de ainda estarmos tão presos nisso, mas sei
que a única forma de caminharmos para uma sociedade mais empática e justa é que
aprendamos a lidar com as diferenças sem subjugar culturas diferentes. Esse é
um trabalho complicado, que envolve se observar, pensar sobre suas ações e,
todos os dias, buscar se (re)inventar. E da próxima vez que eu vir uma cena
inusitada como aquela, espero que eu tenha uma reação diferente. Talvez até
passe por perto para ver como anda o jogo.